quinta-feira, 22 de outubro de 2009

E QUANDO O MÉDICO É A VÍTIMA?

Ao assistirmos os noticiários ou lermos jornais, nos deparamos com uma infindável quantidade de propagandas no sentido de "pacientes" buscarem seus "direitos" quando são supostamente expostos a um erro médico. Diante disso surge a pergunta: e quando o médico é a vítima? O médico de família, profissional este que acompanhava gerações de uma mesma família, tratando tanto da saúde física quanto da psíquica de seus pacientes, chegando ao ponto de ser ver envolvido em questões íntimas, agindo inclusive como um fiel amigo e conselheiro? Em anos não muito distantes, ninguém teria a audácia de intentar processo judicial contra um profissional dotado de tal índole e respeitabilidade.Os meios de comunicação, dentro de suas atribuições e visando alertar a população, com um certo alarde, chamou atenção em relação aos direitos por vezes desconhecidos do grande público, com relação aos modos de conduta dos profissionais da área da saúde. Nessa discussão acerca da busca pelo direito, aparecem meios a serem seguidos, nos quais, de forma abrupta, os médicos vêem-se envolvidos. A exemplo posso citar uma cirurgia que supostamente deixou seqüelas, o tratamento que não obteve a tão esperada cura, uma avaliação serôdia de uma doença são facilmente confundidos e tidos como sinônimos de erro, imperícia ou falta de prática. De forma abrupta, o profissional da área da saúde tornou-se uma espécie de presa indefesa, pois sob a ótica fria do direito penal, o erro medico encontra-se condicionado pela culpa, ou a tentativa de caracterização desta. A postura e conduta do médico – independente da especialidade na qual atua – deve amoldar-se em fatos imprevisíveis que causariam danos ao paciente, em situações que seriam previsíveis de modo seguro. No que tange à alegação de imperícia, esta busca comprovar a falta de capacidade técnica do profissional ou do conhecimento específico na realização do ofício privativo do médico, no qual o mesmo de forma alguma pode renunciar a habilidade para realizá-lo. Relativamente à imprudência, esta somente restará comprovada se o clínico praticar um ato perigoso, usando como exemplo dar alta após uma avaliação física realizada rápida e superficialmente. Por fim destaco a culpa ou negligencia, onde deverá ser averiguada se realmente houve omissão da obrigação em proceder com determinado ato que poderia ser julgado de procedimento imperativo. Ações judiciais contra os profissionais da medicina vem crescendo em escala geométrica em nossos Fóruns e Tribunais, colocando estes em delicada situação, pois qualquer paciente que se ache insatisfeito com os métodos de trabalho desenvolvidos, ou com os resultados do tratamento que lhe fora proposto, quando resolve processar o médico, promove ações nas áreas cível e criminal, sem mencionar denuncia perante o Conselho Regional ou Federal de Medicina. Mediante a tais fatos, aconselho que o médico, ainda no início do tratamento esclarecer ao paciente que a decisão de aceitar ou não a intervenção médica é do mesmo; cabendo ao médico propor o tratamento e esclarecer o paciente, com informações adequadas, sobre os riscos; e, por fim, o paciente deve estar cientificado que está assumindo todos riscos da decisão tomada. Toda essa questão concernente ao erro médico mora na caracterização da modalidade de obrigações do contrato celebrado entre o médico e o seu cliente, onde estas obrigações seriam de meios ou de resultados. No campo do direito, mais precisamente o das obrigações contratuais positivas, onde se exige do devedor um comportamento ativo de “dar ou fazer alguma coisa”, são conhecidas duas modalidades de obrigações: a de meios e a de resultado. Na obrigação de meio, existe um compromisso de utilização de todos os recursos disponíveis para se obter o melhor resultado, sem, contudo, ver-se obrigado a alcançar esse êxito, tão justo e tão legítimo. Busca-se, é claro, um resultado, mas em não se cumprindo a meta - e inexistindo a culpa do devedor - não há o que cobrar, enquanto na obrigação de resultado, a prestação de serviço tem um fim efetivamente definido: se não houver o resultado esperado, há inadimplência e o devedor assume o ônus por não ter satisfeito a obrigação prometida. Pelo que se depreende do ato médico, por sua complexidade e aspecto conjuntural, a responsabilidade civil do profissional só pode comportar uma obrigação de meios ou de diligência, onde o próprio empenho do médico é o objeto do contrato, sem o efetivo compromisso de obtenção de resultado. Contudo, isto não desobriga o médico de empenhar-se da melhor maneira e utilizar-se de todos os recursos necessários e disponíveis em favor de seu paciente. Assim, não se pode falar em culpa se ficar comprovado que apesar de todo o empenho profissional não se alcançou o resultado desejado, ou se a evolução da doença escapou ao conhecimento da ciência e ao controle do médico - mesmo que ele tenha agido dentro dos padrões técnico-científicos da profissão. Ou seja, mesmo naquelas especialidades antes consideradas obrigação de resultado, como a cirurgia puramente estética, já se encara com reserva o conceito radical de êxito absoluto, pois o mais correto é sempre guiar-se pelas circunstâncias inerentes a cada caso. Do contrário, incorre-se no erro de se contrapor à própria natureza e à lógica euclidiana dos fatos. Dessa forma, admite-se como regra geral que a obrigação do médico é a de meios, mesmo porque o objeto do seu contrato é a própria assistência ao paciente, ocasião em que se compromete a empregar todos os recursos ao seu alcance sem, no entanto, garantir sempre o sucesso, e por conseqüência lógica, não poderá ser culpado aquele cuja ação e todo empenho empregados foram inúteis, em face da inexorabilidade do caso, tendo o profissional agido de acordo com a “lei da arte”, ou seja, quando os meios por ele empregados eram de uso adequado e sem contra-indicações. Face a tais argumentos, destaco que expor a imagem do médico antes da conclusão da uma pormenorizada investigação ou o punir em tais circunstâncias, alegando-se obstinadamente uma “obrigação de resultado”, não seria apenas um exagero, seria uma injustiça. Por derradeiro, aponto que nos dias atuais, não bastam, pois, o conhecimento e a habilidade técnica. Faz-se necessário que o médico sempre demonstre estar interessado nas pessoas, promovendo, além de empatia e respeito, capacidade para ouvir e argúcia no observar - aliadas à efetiva consciência de suas limitações, destacando que o médico não poderá jamais abrir mão dos princípios milenares que o estimulam a continuar buscando uma medicina calcada no humanismo e na justiça social, devendo, portanto, buscar uma relação médico-paciente ideal, baseada na transparência, lealdade e confiança mútua. Se assim proceder em sua jornada diária de trabalho, estará contribuindo sobremaneira para a minimização das denúncias de pacientes e familiares contra os chamados erros médicos.

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